
Por volta dos meus 8 anos, morava perto da escola, quase um quilometro de distância da minha casa. Mesmo assim, a minha mãe me levava e ia buscar sempre. Neste período, eu estudava à tarde. Confesso que não gostava quando a minha mãe interrompia as minhas brincadeiras e ordenava que eu fosse tomar banho, para ir à escola; era quase uma morte das minhas horas de prazer, vestir aquele uniforme que todos vestíamos, achava uma monotonia e falta de colorido a perturbar a liberdade do meu imaginário e da minha individualidade.
A minha mãe era super protetora e autoritária, mas tinha uma presença mágica em cada detalhe, e com tantos talentos. A casa e tudo era cercado pelo seu gesto e suas construções femininas de bordados, pinturas. Tanto eu e quanto a minha irmã, éramos vestidas com roupas belíssimas, confeccionadas por ela. Eu sempre pedia para fazer a mesma roupa para minha boneca.
A minha mãe tinha fobia em relação ao barulho de trovão, era algo que a perturbava de forma sem controle, uma fobia mesmo! Todos da família sabiam que se chovesse muito com trovão, ela precisava de socorro. Ela ficava assustada e buscava abrigo; se estivesse em casa, ficava na cama debaixo de cobertas sobre a cabeça e quando passava o trovão, tudo normal.
Ela me deixou na escola, com um beijo rápido na cabeça e seguiu com o olhar a minha entrada na sala de aula. No meio da tarde começou a chover muito e de repente os trovões. Quando na saída, a Freira do colégio me avisou para esperar o meu irmão mais velho que vinha me buscar. Imediatamente me lembrei da minha mãe e não pensei duas vezes, saí correndo do colégio para minha casa, tomando um banho de chuva, com o pensamento fixo de salvá-la do medo do trovão, ela estava sozinha em casa e quem iria protegê-la?
Quando cheguei a nossa casa tudo fechado e eu a gritar por ela bastante tempo. A vizinha tinha levado-a para sua casa e me chamou. Entrei e fui para os braços da minha mãe, chorando e ela também, eu dizia soluçado que queria protegê-la do trovão, ela com uma toalha bem fofa me enxugando, dizendo que eu era muito corajosa, mas nunca mais fizesse isso, tinha que esperar um adulto para me buscar na escola. A vizinha se aproximou de mim e disse: “muito bonito este seu amor pela sua mãe!” e me deu um beijo na testa.
Noutro dia, fiquei em casa com gripe, por conta da chuva que levei, mas a minha mãe cuidando de mim e eu com status de super-herói, na cama brincando com as minhas bonecas e aconselhando a não andar na chuva sem capa.
Até hoje me lembro das cenas e o meu sentir de socorrer a minha mãe do medo e, quem sabe, isso não teria me levado à escolha da minha profissão de Psicóloga. A vida tem mistérios tão belos construídos num bordado de sentidos e significados.
Sempre que chovia com trovão, onde eu estivesse, telefonava para minha mãe, para saber dela. Após a ligação, eu me encontrava com a minha menina correndo na chuva e o nosso abraço. E, assim, a minha mãe, a minha menina e o nosso abraço moram sempre dentro de mim, com o lembrete do amor que cuida e abraça no grito de socorro!…
Suzete Brainer (Direitos autorais registrados)